quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Sobre você escolher ir embora

Vejo os seus olhos tão distantes, tão dispersos, tão fora de mim. Esses olhos que apertam quando você solta aquela gargalhada. Tais olhos que no meio da escuridão eu ainda conseguia enxergar e eram tão bonitos de ver. Quando o ápice do nosso amor acontecia, você os fechava e eu podia passar o dia inteiro olhando aquela cena. Seus olhos não eram daqueles que falavam, até porque eu nunca soube o que diziam, mas eles olhavam, observavam e às vezes escapavam pelas laterais, me fazendo mostrar a cara de “hey, estou vendo você fazer isso”. Seus olhos eram diferentes e eu gostava de olhá-los. Muitas vezes você perguntava por que eu estava lhe encarando, mas era só eu olhando para os pares castanhos que você carrega com tamanha seriedade. Ah, a tal da seriedade me afugentava. Enquanto você era o homem dos olhares, eu era a moça dos sorrisos. Você transmitia o mundo por um olhar. Quando eu dizia algo suspeito, você os comprimia e com um sorriso torto alegava que não era nada bobo. Talvez seja esse o motivo da saudade que sinto. Você olhava tudo e todos, mas o bonito ainda estava por vir. Quando os seus olhos se fechavam, eu sorria. Lembro que você tem uma dancinha engraçada que me deixava toda apaixonada. Era algo com os braços e as mãos próximos ao peito, cabeça e corpo mexendo de um lado para o outro, olhos cerrados e a voz propositalmente mais grossa para que a música e você pudessem combinar na melodia. Seus olhos me fascinavam nesse momento. Era o seu momento, era o prazer de poder não olhar e só cantar ou tocar. Mais perfeito que esse momento era o seu olhar para uma criança. Bobo, desajeitado e disperso. Eu sorria, você olhava, sempre foi assim. Que mulher não se apaixonaria por seu olhar? Quando você estava longe de mim, eu tinha o costume de lhe olhar e se você me olhasse de volta já enviava uma piscadela e um beijo, que eu retribuía sorrindo, claro. Quantas saudades os seus olhos me dão. Quantas lembranças os seus olhos me trazem. Tenho os meus momentos preferidos que talvez você nunca tenha reparado. E um deles era quando você acendia um cigarro, cerrava apenas um dos olhos e dava a primeira tragada com olhar de desconfiado, mas sábio. Fosse encostado na sacada ou parado em uma calçada qualquer, o seu olhar ao acender um cigarro me fazia querer pular no seu colo e sussurrar coisas que ninguém jamais ouviria, só você. Ontem os seus olhos me trouxeram a primeira tristeza, pois eu olhei disfarçadamente para eles e vi você olhando. Mas era um olhar pesado, não era amor. Não era saudade, não era admiração, não era você me despindo com eles como já havia me acostumado. Eram só aqueles olhos distantes, vagos, sem pretensão de futuro. Do dia para a noite eu não era mais o encanto dos pares de olhos mais loucos que conheci. Meu sorriso era o seu olhar, e agora uma lágrima ocupa tal lugar. Eram dos seus olhos e do poder que eles exerciam sobre mim que sentirei mais saudades, agora eu sei.

- Jana Escremin

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