segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Telefone sem fio, sem voz, sem amor

É tarde. O telefone toca. Do outro lado ninguém para falar qualquer palavra. Ela tenta ouvir alguma respiração, mas não existe nada do outro lado da linha. Desliga. Ela demora alguns minutos para dormir e fica pensando no que poderia ser. O silêncio assusta, mas ela vive dele. No meio da noite ela repara que precisa cortar os cabelos, fazer as unhas, continuar o inglês, comprar novas roupas e colar novos adesivos na parede. Ela nunca tem tempo para os seus pensamentos. Quando o telefone tocou, ela só esperou que alguma coisa sacudisse o seu mundo. Nada aconteceu. Ela não tem para quem falar desse desejo que tem nome. Quem já ouviu cansou, quem não ouviu ainda não está pronto. Vira na cama e não entende o motivo de tantos pontos finais. Tudo ela precisa finalizar? Não tem certeza. Ela começa a enumerar todas as vezes em que saiu de cena sem conhecer o miolo da história. Dessa vez ela não vai fugir. Faz tanto tempo que a desilusão passou pelo seu coração, que agora quer sentir tudo de novo. Mas ela confessa que espera que dessa vez dê certo. Transformou em pedra todos que se aproximavam e esqueceu-se da sensação do peito ardendo, das loucuras e das vontades. A noite é longa e seu sono nunca vem. Ela vive de espera, e o seu sono é só mais uma delas. Enquanto fazia os planos para um futuro não tão distante, lembrou de uma vez que a vidente só falou coisas boas, e muitas vezes teve razão. Mas ela teria que esperar. A mulher só falou do próximo ano, previsões que ela desconhecia ou que nem haviam começado. Foram tantas previsões que ela fazia questão de recordar toda noite: O homem que ela viu naquele livro, a viagem que prometia trazer novas experiências. O documento que deixariam as coisas mais leves. A grande mudança no início do ano. Tudo estava começando a deixa-la ansiosa demais para dormir. Quem é o homem? Para onde é a viagem? Que mudança é essa? Se a vidente fosse verdadeira ela só poderia afirmar no próximo ano. Despertando das previsões, a moça olha mais uma vez para o telefone e se pergunta por que é tão difícil acreditar que ninguém estava do outro lado da linha. Ela aperta os olhos e pensa em alguma maneira de se sentir viva. Amar não é uma escolha, ela teria que esperar para ser amada. Nem as madrugadas poderiam fazer ela sentir alguma coisa diferente. Ela não encontra uma posição para dormir e assume que nem as esperanças podem tirá-la do tédio. Tudo o que quer tem que esperar, e ela odeia esperar. Consulta mais uma vez o celular, ninguém para compartilhar da sua loucura. Ninguém para dizer o quanto ela precisa estar ali. Engana-se quem acha que ela está triste, na verdade sua sede de emoção é porque ela está entediada. É o tédio que a consome e não traz emoção. Ela vive de emoções. Sua liberdade está parada. Ela começa a adormecer e antes que apague faz uma promessa tão baixinho que nem ela consegue escutar. Ela sabe que as palavras têm força e ao invés de gritar, ela pede um socorro leve e simpático. Nunca soube impor seus desejos e continua vagando pela noite com sonhos, ideias e uma vontade louca de sair do lugar. Essa moça sonha mais acordada do que dormindo.

- Jana Escremin

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